RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA: O ENFOQUE DO STJ
O Agravo em Recurso Especial nº 2367515 (MT, 2023) relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti trata de uma ação indenizatória relacionada a um procedimento cirúrgico estético mal-sucedido, em que a paciente não obteve o resultado desejado após uma cirurgia plástica.
Aspectos Jurídicos da Decisão:
Obrigação de Resultado: A Ministra reafirmou que, no contexto de cirurgias estéticas, a responsabilidade do médico é de resultado, ou seja, o médico é responsável pelo sucesso da operação, sendo que, se o resultado não for atingido, presume-se a culpa do profissional. Portanto, cabe ao médico demonstrar que fatores externos ou alheios à sua atuação são os responsáveis pelo insucesso.
Inversão do Ônus da Prova: A decisão reitera que, devido à obrigação de resultado na cirurgia estética, o ônus da prova é invertido em desfavor do médico. Isto significa que, para evitar a responsabilidade, o médico deve provar que o insucesso foi causado por fatores fora do seu controle.
Reexame de Fato e Provas: A decisão também afirma que reexaminar as provas do caso, como o que foi feito em primeira instância para verificar a responsabilidade do médico, não é permitido em um recurso especial, conforme a Súmula 7 do STJ. Assim, a Corte não pode reavaliar a prova, apenas analisar a aplicação correta do direito.
Quantum da Indenização: A decisão reiterou que a revisão do valor da indenização só é possível quando o valor fixado é considerado irrisório ou exorbitante. Caso contrário, a análise do quantum demandaria novo exame fático, o que também é vedado pela Súmula 7 do STJ.
Jurisprudência: A decisão do STJ foi coerente com a jurisprudência consolidada sobre a responsabilidade dos médicos em cirurgias estéticas, destacando que a responsabilidade objetiva é presumida, e a questão do eventual erro médico só pode ser afastada com a apresentação de provas robustas que comprovem causas externas.
Decisão: O recurso especial foi negado, e a decisão da instância inferior, que manteve a responsabilidade do médico e a obrigação de indenizar, foi ratificada.
A decisão foi publicada no DJe do STJ em 28 de agosto de 2023, e foi concluída pela Ministra Maria Isabel Gallotti.
Devemos sempre lembrar da importância da consulta do Registro de Qualificação do Especialista (RQE) do cirurgião plástico, do médico perito e dos médiccos assistentes técnicos, verificação é crucial para garantir a qualificação dos profissionais envolvidos. A paciente, ao buscar um cirurgião plástico, deve certificar-se de que ele possui o RQE na especialidade de Cirurgia Plástica, o que garante que ele tem a formação e o treinamento adequados para realizar o procedimento. Da mesma forma, é fundamental que os médicos peritos que atuam no caso, tanto o perito judicial quanto o assistente técnico da paciente, também sejam especialistas em Cirurgia Plástica e em Medicina Legal e Perícia Médica. Essa dupla especialização garante que eles possuem o conhecimento técnico necessário para avaliar adequadamente a conduta do cirurgião e os danos alegados pela paciente. A consulta ao RQE pode ser feita no site do Conselho Federal de Medicina (CFM), na seção "Busca por Médicos".
Referências Legais Citadas:
- Art. 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC)
- Art. 186 e 951 do Código Civil
- Súmulas 7 e 284 do STF, que limitam a análise de questões fáticas e provas no recurso especial.
TEXTO DA DECISÃO NA ÍNTEGRA:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2367515 - MT (2023/0164545-5)
RELATORA : MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI
DECISÃO
Trata-se de agravo contra decisão que negou seguimento a recurso especial interposto em face de acórdão assim ementado:
AÇÃO INDENIZATÓRIA - CIRURGIA MAMÁRIA ESTÉTICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MÉDICO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DA PACIENTE - EXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O RESULTADO NÃO ATINGIDO E A CIRÚRGIA PLÁSTICA - DEVER DE INDENIZAR MANTIDO - RECURSO DESPROVIDO.
1- A obrigação do médico em cirurgia plástica com fins estético é de resultado e, de conseguinte, inverte-se em desfavor do profissional o ônus da prova, de modo que para afastar a responsabilidade civil ele deve demonstrar que os danos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante o procedimento, sendo certo que a utilização da técnica adequada não é suficiente para afastar a sua culpa.
2 - No caso, embora o perito judicial tenha constatado que o profissional utilizou boa técnica, não há provas de que o resultado decorreu de fatores externos e alheios à sua atuação durante o procedimento cirúrgico. Dever de indenizar mantido.
Nas razões de recurso especial, alega a parte agravante violação dos arts.
14, 4º, do Código de Defesa do Consumidor; 186 e 951 do Código Civil, além de divergência jurisprudencial. Sustenta que a execução da intervenção cirúrgica de acordo com os padrões técnicos afasta o dever de indenizar. Desse modo, não haveria de pagar a indenização fixada em R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
Assim posta a questão, verifico que o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência desta Corte, para a qual a cirurgia estética é
obrigação de resultado, de modo que a culpa do médico pelo resultado não atingido é presumida, de modo que cabe ao profissional demonstrar a excludente de sua responsabilidade. A respeito do tema, confiram-se:
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DO DEMANDADO.
1. É deficiente a fundamentação recursal quanto a parte invoca ofensa ao artigo 1.022 do CPC, mas não aponta especificamente, em que omissão, contradição ou obscuridade incorreu o acórdão recorrido, incidindo, na espécie, o óbice previsto na Súmula 284 do STF.
2. Nos termos da jurisprudência do STJ, a cirurgia plástica tem natureza de obrigação de resultado, o que atrai a presunção de responsabilidade do médico,
que deve comprovar alguma excludente de sua responsabilização pelos danos causados ao paciente. Precedentes.
2.2. Na hipótese, rever o entendimento da Corte local que reconheceu a responsabilidade do médico pelo não atingimento do resultado da cirurgia estética
exigiria o reexame de todo acervo fático e probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, em observância ao disposto na Súmula 7 do STJ.
3. A revisão da indenização por dano moral apenas é possível na hipótese em que o quantum arbitrado nas instâncias originárias se revelar irrisório ou exorbitante. Não estando configurada uma dessas hipóteses, não cabe reexaminar o valor fixado a título de indenização, uma vez que tal análise demanda incursão na seara fático-probatória dos autos, atraindo a incidência da Súmula 7 do STJ.
Precedentes.
4. Agravo interno desprovido.
(AgInt nos EDcl no REsp n. 2.010.474/AM, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 10/3/2023.)
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. AFRONTA AOS ARTS. 3º, § 2º, E 4º DO CDC. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. ADMISSÃO DE PREQUESTIONAMENTO FICTO. NECESSIDADE DE INDICAÇÃO DE AFRONTA AO ART. 1.022 DO NCPC. CIRURGIA PLÁSTICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO.
EXCLUDENTES. AUSÊNCIA. DEVER DE INDENIZAR. REVISÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
1. Decisão agravada reconsiderada, na medida em que o agravo em recurso especial impugnou os fundamentos da decisão que inadmitiu o apelo nobre, exarada na instância a quo. 2. Esta Corte de Justiça, ao interpretar o art. 1.025 do Código de Processo Civil de 2015, concluiu que "a admissão de prequestionamento ficto (art. 1.025 do CPC/15), em recurso especial, exige que no mesmo recurso seja indicada violação ao art.
1.022 do CPC/15, para que se possibilite ao órgão julgador verificar a existência do vício inquinado ao acórdão, que uma vez constatado, poderá dar ensejo à
supressão de grau facultada pelo dispositivo de lei" (REsp 1.639.314/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 4/4/2017, DJe de
10/4/2017).
3. Consoante a jurisprudência desta Corte, "possuindo a cirurgia estética a natureza de obrigação de resultado cuja responsabilidade do médico é presumida, cabe a este demonstrar existir alguma excludente de sua responsabilização apta a afastar o direito ao ressarcimento do paciente" (AgRg no REsp 1.468.756/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, DJe de 24/5/2016).
4. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, em nova análise, conhecer do agravo para negar provimento ao recurso especial.
(AgInt no AREsp n. 1.988.403/RJ, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 13/2/2023, DJe de 24/2/2023.)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. RENOVAÇÃO DO
PEDIDO NA VIA ESPECIAL. DESNECESSIDADE. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CIRURGIA PLÁSTICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OBRIGAÇÃO DE
RESULTADO. PROFISSIONAL QUE DEVE AFASTAR SUA CULPA MEDIANTE PROVA DE CAUSAS DE EXCLUDENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO.
1. Nos termos da jurisprudência mais recente desta Corte, não há mais necessidade de o recorrente renovar o pedido de concessão do benefício da
assistência judiciária gratuita na interposição do recurso especial se ele já vem litigando sob o pálio da justiça gratuita.
2. Possuindo a cirurgia estética a natureza de obrigação de resultado cuja responsabilidade do médico é presumida, cabe a este demonstrar existir alguma excludente de sua responsabilização apta a afastar o direito ao ressarcimento do paciente.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp n. 1.468.756/DF, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 19/5/2016, DJe de 24/5/2016.)
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. COMPROVAÇÃO DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO
ESPECIAL EM AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DO EXPEDIENTE FORENSE. POSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 6º, VII, DO CDC. ERRO
MÉDICO. DANOS MORAIS. CASO FORTUITO. FORÇA MAIOR. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ.
1. A comprovação da tempestividade do agravo em recurso especial em decorrência de suspensão de expediente forense no Tribunal de origem pode ser
feita posteriormente, em agravo regimental, desde que por meio de documento idôneo capaz de evidenciar a prorrogação do prazo do recurso cujo conhecimento pelo STJ é pretendido.
2. Nas obrigações de resultado, cumpre ao médico demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia.
3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a excludente de caso fortuito possui força liberatória e exime a responsabilidade do cirurgião plástico.
4. Afastar as conclusões do Tribunal de origem acerca da ocorrência da excludente de responsabilidade do cirurgião plástico demandaria o necessário reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada em recurso especial, nos termos da Súmula n. 7/STJ.
5. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp n. 764.697/ES, relator Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 1/12/2015, DJe de 11/12/2015.)
Aplica-se ao caso a Súmula 83/STJ.
Ademais, verificar se a cirurgia foi feita de acordo com os padrões técnicos exigidos para o caso não prescinde do reexame de prova, o que faz incidir sobre o caso também a Súmula 7/STJ.
Em face do exposto, nego provimento ao agravo em recurso especial.
Intimem-se.
Brasília, 24 de agosto de 2023.
MARIA ISABEL GALLOTTI
Relatora